sexta-feira, 31 de maio de 2013

Favela Orgânica



Sabores e lições de uma gastronomia 100% sustentável

Era um domingo de sol. Acordei entusiasmada para sair de Nova Iguaçu rumo à Babilônia, no Leme, Zona Sul do Rio de Janeiro. Levei a minha Nikon D3000 e, depois de duas horas de viagem, cheguei à casa da Regina Tchelly, uma nordestina de 32 anos e criadora do projeto “Favela Orgânica”, que através de suas ações, tem transformado a comunidade.

Apesar de ter virado um empreendimento, o Favela Orgânica ainda mantém seu princípio social. As oficinas de gastronomia alternativa são realizadas todas as quintas-feiras na Associação de Moradores da Babilônia, gratuitamente. Além das oficinas, Regina Tchelly está montando hortas para os moradores da comunidade. “Já foram feitas 22 hortas. A meta inicial é de 100”, conta. “A única coisa que eu peço é a boa vontade, amor e tempo para regar”.

A dona de casa Marli Rugge aceitou a horta e pretende se alimentar muito melhor a partir de agora. “Conheço Regina há quase onze anos e ela é um exemplo para toda a comunidade. Além de ter que sustentar sua família, se compromete em ajudar aos outros”, conta. “Aos poucos a comunidade está sendo vista com um olhar de potencialidade. Através do trabalho desenvolvido pela Regina, alguns moradores da comunidade tem se reeducado. Tenho muito orgulho de ser parte dessa modificação”, conclui Marli.
A motivação para o projeto surgiu da indignação de Regina Tchelly, que veio da Paraíba, e ao chegar ao Rio de Janeiro ficou surpreendida com a quantidade alimentos que era desperdiçada ao final das feiras. “Não é justo desperdiçar tanto alimento. Nas partes rejeitadas está concentrada a maior parte dos nutrientes das frutas e verduras”, afirma Tchelly. 

O ciclo do alimento: aproveitamento total

A ideia é aproveitar tudo do alimento, da casca ao caroço. “Queremos tratar o alimento com respeito”, diz Tchelly, que nunca foi cozinheira profissional. A experiência que tem foi adquirida em cozinhas domiciliares enquanto trabalhou como empregada doméstica.

Regina conta que o que não pode ser aproveitado torna-se adubo para pequenas hortas. Isso reflete em um aproveitamento de 100% do alimento. “As sobras viram compostos que vão para o adubo orgânico e do adubo volta para o alimento”, explica Tchelly, enquanto prepara um delicioso macarrão cremoso com casca de abóbora para o almoço de domingo.

O projeto já contagiou a comunidade e pretende crescer mais

Apesar de toda visibilidade e reconhecimento, o projeto ainda tem muito que avançar e precisa de ajuda.  Para colocar em prática o ciclo do alimento, Regina ainda precisa de espaço. “Pretendo abrir uma cantina-escola. Um espaço onde eu possa dar as oficinas, cultivar hortas e comercializar pratos. O projeto que é totalmente sustentável é referência de país de primeiro mundo. Mas para isso preciso de financiamento”, conta a empreendedora que está de olho nos editais.

Empresas começaram a solicitar palestras para seus funcionários sobre aproveitamento das sobras dos alimentos e também a pedir o serviço de bufê para eventos corporativos. Ano passado, Regina Tchelly e sua equipe participaram de muitos debates sobre economia doméstica e sustentabilidade na Rio+20.

Feijoada vegetariana, Risoto de Casca de Melancia, Arroz de Folhas Verdes, Moqueca com talos de legumes, bolo de casca de banana, macarrão cremoso com cascas de inhame, yakissoba de casca de melancia, são algumas das iguarias criadas por Regina Tchelly e que fazem o maior sucesso de mesa em mesa.

Julia Santana, 24 anos, estudante de arquitetura da UFRJ, sobe a ladeira do Chapéu para participar das oficinas. “Acredito muito no projeto, pois tem um grande potencial de modificação e tem modificado meus hábitos”, declara a estudante.

“Economia doméstica, reeducação alimentar e sustentabilidade são valores da Favela Orgânica que enxerga hábitos alimentares do cotidiano como uma possibilidade de saúde, economia e aumento da renda familiar. Isso é genial e tenho orgulho de fazer parte desse movimento”, conclui.














Texto e fotos: Juliana Portella
publicado em vivafavela.com.br